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Por Cristina Tardáguila Agência O Globo
23/04/2012 10:13
RIO - A Comissão Parlamentar de
Inquérito (CPI) que investiga desde junho, no Senado, a atuação do Escritório
Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) apresenta, na próxima terça-feira,
seu relatório final.O documento, a que O GLOBO teve acesso, divide-se em duas
partes: uma punitiva e uma propositiva. Na primeira, a CPI determina, entre
outros pontos, que a cúpula da entidade responsável por recolher e pagar o
direito autoral de todos os músicos do país e os dirigentes das associações que
a compõem sejam alvo de 21 indiciamentos. Entre os crimes apontados pelos
senadores Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Lindbergh Farias (PT-RJ), presidente e
relator da CPI, respectivamente, estão apropriação indébita de valores, fraude
na realização de auditoria, formação de cartel e enriquecimento ilícito.
Na segunda parte do relatório,
que tem 350 páginas e três mil documentos anexados, a CPI apresenta um novo
projeto de lei que tira do Ministério da Cultura (MinC) e leva para o
Ministério da Justiça (MJ) todas as questões relativas à gestão dos direitos
autorais no país.
- É que o órgão controlador não
pode ser economicamente menos expressivo do que o setor a ser controlado -
explica Lindbergh. - Em 2011, o orçamento empenhado do MinC foi de R$ 507
milhões, e o Ecad arrecadou R$ 541 milhões.
- Além disso, é no MJ que estão a
Defesa do Consumidor, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e o
combate à pirataria. Lá tem estrutura para regular uma atividade assim -
acrescenta Randolfe.
Para aumentar a transparência do
sistema, a CPI propõe a criação de uma Secretaria do Direito Autoral e de um
Conselho Nacional dos Direitos Autorais dentro do MJ. A nova estrutura
administrativa, a ser gerida de forma tripartida por representates do poder
público, titulares de direitos autorais e membros da sociedade civil, poderá
regular, mediar conflitos e fiscalizar as entidades de gestão coletiva de
direitos autorais.
A comissão sugere ainda o
surgimento de uma ouvidoria independente para tramitar reclamações do setor.
Hoje, lembram os senadores, não existe nenhuma instância pública capaz de fazer
isso.
A CPI ainda quer a criação de um
portal de transparência que reunirá todas as informações referentes a receitas
e despesas das entidadesde de direito autoral. Seria algo semelhante ao que a
Controladoria Geral da União (CGU) faz com os gastos públicos hoje em dia.
- Também propomos o fim do
sistema de amostragem, usado pelo Ecad para fazer suas cobranças e repasses -
destaca Randolfe. - Propomos que todas as rádios e TVs do país divulguem
trimestralmente em suas páginas as músicas que realmente usaram.
- Segundo o novo projeto, quem
fixa o preço do direito autoral é o autor e sua associação - ressalta
Lindbergh. - A exemplo do que acontece nos Estados Unidos, se houver
divergência entre o usuário e a associação, o MJ vai homologar o preço final. O
Ecad deverá ser apenas uma secretaria executiva dos titulares de direitos
autorais. Quem manda é o autor.
Hoje, o valor cobrado é fixado
pelo Ecad (após aprovação de sua assembleia) e só pode ser questionado
judicialmente.
O projeto de lei também promete
mudar a estrutura da gestão do direito autoral no Brasil. Atualmente, as
associações misturam compositores, cantores, produtores. A CPI quer que elas se
dividiam por categoria. E, para poder funcionar, a associação deverá vencer
licitação feita pelo MJ a cada cinco anos.
No texto final, a CPI também pede
ao Cade que "promova o rápido julgamento" e "a efetiva
condenação" do Ecad e das associações por "infração da ordem
econômica". Desde agosto, o órgão investiga a estrutura por práticas de
cartel.
Ecad rebate
Procurado, o Ecad rebateu as
acusações que embasam os 21 indiciamentos propostos pela CPI do Senado.
Com relação à suposta apropriação
indébita de 2004, lembra que seu regulamento "prevê que ao final de cinco
anos, caso os créditos retidos não sejam identificados, a assembleia geral pode
decidir seu destino".
Sobre fraude em auditoria, diz
que, em 2009, contratou a BDO Trevisan mas que, diante da lista de documentos
que lhe "pareceram desnecessários" apresentada pela empresa, decidiu
distratá-la em favor da Martinelli Auditores.
Sobre o suposto enriquecimento
ilícito de seus administradores, o Ecad informa que seu Programa de
Participação nos Resultados "foi criado por uma empresa especializada e é
auditado constantemente por empresas de auditoria externa". E, quanto à
suposta prática de cartel, destaca que o Ministério Público emitiu parecer
"manifestando-se pelo arquivamento do processo por inaplicabilidade do
direito concorrencial".
Sobre o novo projeto de lei, o
Ecad diz não ser "contrário a qualquer supervisão, desde que seja técnica,
sem viés politico, dentro dos limites constitucionais, e que preserve o direito
do autor de fixar o preço pela utilização de sua obra".
O relatório final será votado na
quinta-feira e apresentado à Procuradoria Geral da República, à Casa Civil e ao
Ministério da Justiça. Para o mesmo dia, está previsto um ato da Frente
Parlamentar de Cultura em apoio ao documento no salão nobre da Câmara.